O autor inicia com uma perspectiva panorâmica histórica social do design ou o discurso projetual e crítica o modo como que o termo é aplicado atualmente e se associa a “modismos” e a rótulos, o que torna o design, para a opinião pública, como um envoltório, uma glamourização dos artefatos, (objeto caro, pouco prático e divertido ─ fun design), e que acaba por distanciá-lo da ideia de “solução inteligente de problemas”.
Em seu entendimento, é inegável a expansão das ciências e da tecnologia, por meio da industrialização na vida cotidiana. Contudo, o ensino de projeto (design) é desigual quanto comparado ao ensino de ciências (cognição). Há alguns pontos de aproximação (design ─ ciências), mas são esporádicos. O modo imaginado de superação desta distância seria a criação de instituições fora do sistema formalmente estabelecidas.
Esta aproximação não é uma tentativa de transformar o design em ciência ou um design científico, mas criar uma correspondência entre complexidade temática e metodologia. O design utiliza o conhecimento científico quanto necessário. Outro ponto é reconhecer que existe projeto (design) nas disciplinas científicas.
Inicialmente, Bonsiepe, critica as medidas (invasões, matanças, bombardeios, genocídios, torturas, quebras de lei etc) tomadas por conta da “defesa da democracia”. Situa que na concepção neoliberal, a democracia é “sinônimo” da predominância do mercado, e é aplicada pelo “centro” como um sedativo para continuar com sua dominação. Sua interpretação de democracia é no sentido de possibilitar a participação dos dominados, para criar um espaço de autodeterminação, reduzindo a heteronomia (entendida como subordinação a uma ordem imposta por agentes externos). O design atuaria na criação de um espaço próprio.
Sua interpretação se insere na filosofia iluminista, e não concorda com o fim das Grandes Narrativas, e nem com as correntes pós-modernistas. Confere a necessidade de um elemento utópico para reduzir a heteronomia. As questões que poderiam se levantar sobre tal afirmação é: o pós-modernista também não tem componentes utópicos? Sua própria definição de democracia não seria uma utopia?
Sua linha de raciocínio chega até o design, por meio da aplicação de um conceito de Humanismo (“exercício de nossas competências da linguagem em compreender, reinterpretar e lidar com os produtos da linguagem”). Assim é interpretada como um “Humanismo projetual” (exercício das capacidades projetuais para interpretar as necessidades de grupos sociais e elaborar propostas viáveis, emancipatórias, em forma de artefatos instrumentais e semióticos). Ressalva que sua intenção não deve ser encarada como idealista e ingênua, mas como uma consciência crítica frente ao desequilíbrio de poder entre “centro” e “periferia”. Assim, podem-se explorar espaços alternativos capazes de uma modificação nas relações sociais, uma vez que negam a participação em um espaço de decisão, “trata os seres humanos como meros consumidores no processo de coisificação”.
Bonsiepe, se apropria da análise crítica de Kenneth Galbraith, para colocar o design como um “conjunto” de técnicas das grandes corporação, associadas a técnica de publicidade e vendas para manter e /ou expandir a demanda (consumo) de produtos. Outro ponto destacado é o desmanche da ideia de um mercado impessoal, mas sim relacionado aos monopólios e oligopólios das corporações. Dentro deste contexto, o design é uma ferramenta de poder, e em seu entendimento, se contrapõe como prática que não está disposta a se concentrar em aspectos de poder e força “anônima” (mercado). Sua prática se desenvolve, resistindo ao discurso harmonizador, pode-se negar essa contradição, mas não se pode ignorá-la.
O design é entendido para além da aparência, e engloba os outros sentidos, como tato e a audição. É um envolvimento, um jogo, para provocar uma predisposição positiva, ou negativa, frente à mensagem/produto e seu conteúdo.
Outra reflexão crítica é relacionada ao papel da tecnologia e do design. Bonsiepe observa a falta de pesquisas na América Latina que relacionam a ligação entre tecnologia e o projeto de artefatos, em sua percepção a industrialização deveria ser pensada para democratizar o consumo e permitir que a maioria da população tenha acesso a produtos técnicos para melhorar a sua qualidade de vida. Ressalta a importância do Estado como elo fundamental para o processo de industrialização e cita, acontecimentos recentes na Argentina, para concluir que o modelo Neoliberal de privatização acelerada, levou a um processo de “desdemocratização”, pois as vítimas nunca foram consultadas sobre as medidas tomadas.
Uma preocupação indicada pelo autor é com crescente tendência aos designers se fixarem nos aspectos simbólicos e seus equivalentes ─ branding e o self branding ─ e não em seus elementos de junções. É essencial ao designer buscar um equilíbrio entre o técnico e o semântico. Citando Raimonda Riccini (2005):
A polaridade entre o material e o simbólico, entre estrutura externa e interna, é uma característica típica dos artefatos, enquanto eles são instrumentos e simultaneamente portadores de valores e significados. Os designers têm a tarefa de reconciliar essas duas polaridades, projetando a forma dos produtos como resultado da interação com o processo sóciotécnico (Riccini, 2005).
Ao se associar ao termo sóciotécnico, Bonsiepe, acredita evitar a polêmica entre forma/função, e a concepção errônea de um essencialismo, ou a um padrão de regras determinísticas.
Ao fim, esclarece que o projetar é um paradoxo, significa expor-se e viver com paradoxos e contradições, mas nunca camuflá-los de modo harmônico. O ato projetual deve assumir e desvendar as contradições. A contradição mais forte está exposta entre a distância do que é socialmente desejável, tecnicamente factível, ambientalmente reconhecível, economicamente viável e culturalmente defensível.
Referências:
BONSIEPE, Gui. Design, cultura e sociedade. Design e Democracia. São Paulo: Blucher, 2011.
BONSIEPE, Gui. Design, cultura e sociedade. Design e Democracia. São Paulo: Blucher, 2011.
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