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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Considerações sobre o papel social do objeto técnico e os estilos de vida que ele possibilita

FEENBERG refuta a concepção da tecnologia com um caráter determinista. Descontruindo o argumento da tecnologia baseada uma lógica funcional que é explicada em si mesma, não contendo vinculados à sociedade. Em seu entendimento, a tecnologia tem impactos sociais, pois é resultado de um direcionamento social na escolha de qual tecnologia adotar. Tais escolhas concedem a hegemonia a determinado grupo, em detrimento de outro, de diversos modos.

Por meio desta perspectiva, é possível estabelecer que as teorias e as tecnologias não são determinadas ou fixadas a partir de critérios unicamente técnicos e científicos. Usualmente há mais de uma solução possível para um determinado problema, e a escolha de uma e não de outra solução tecnicamente viável, ocorre pelo poder de decisão final dos “atores sociais”. FEENBERG sugere um teor representativo da escolha social na concepção e constituição de um objeto técnico. Tal indicação promove no objeto um caráter de discurso atribuído por uma escolha social. Um objeto técnico por si só não tem um significado, nem um poder de ação, mas o discurso atribuído a ele socialmente, o torna representativo, com significados e com certo grau de poder, seja ele simbólico ou não.

Se apropriando do exemplo de PINCH e BIJKER,
FEENBERG exemplifica com o desenvolvimento das bicicletas. Surgem quase simultaneamente dois projetos de bicicleta, uma com rodas de tamanhos diferentes com maior velocidade, porém com uma segurança menor, e outra com rodas do mesmo tamanho com menor velocidade, porém com maior segurança. A primeira visava aspectos de esporte, enquanto a segunda, uma aplicação de transporte. Tal processo é denominado como “flexibilidade interpretativa”. Dentro do contexto social do período, optou-se pela segunda opção, bicicletas com rodas do mesmo tamanho, que posteriormente receberam diversos aprimoramentos técnicos, enquanto a opção rejeitada foi contemplada com um aspecto de exótica e pitoresca, sendo vendida como “curiosidade”. 

Um outro exemplo, pode ser tomado por FORTY (2007) ao apresentar o contexto da produção de roupas no século XVIII. Os tecidos com diversos motivos (grafismos) eram destinados as classes operárias (menos favorecidas e assalariadas) enquanto os tecidos brancos e sem motivos, eram utilizados pela classes que possuem os meios de produção (burguesia). Cria-se uma diferenciação de classe social pelo uso de um objeto técnico. Obviamente este processo de construção social não ocorre de modo instantâneo, muito menos isolado, mas está relacionado intimamente com a relação do desenvolvimento da tecnologia e a sociedade que o produziu.

Uma relação semelhante pode ser traçada com o cotidiano. A escolha de um tipo de objeto técnico reflete questões ligadas a uma ideologia/identidade escolhida por certos sujeitos. O objeto técnico “adquire” múltiplas interpretações e camadas de significação que, eventualmente, podem extrapolar sua concepção planejada. Tal processo de construção de significados sociais dos objetos técnicos é construído dentro das relações sociais, da cultura, do local geográfico, do contexto histórico e das escolhas tecnológicas.

E o design?

Referências:
FORTY, Adrian. Objeto do desejo – design e sociedade desde 1750. São Paulo: Cosac Naify, 2007. 
FEENBERG, Andrew.A Tecnologia Pode Incorporar Valores? A Resposta de Marcuse para a Questão da Época. 1995. link.
 

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